Kente: Tecido da realeza africana foi tema de Camarote em Salvador
Camarote Casa de Gana destacou tradição e modernidade através da moda e cultura
Salvador recebeu pela primeira vez um camarote internacional durante sua programação de carnaval. A Embaixada de Gana, país da África Ocidental, foi responsável por promover a iniciativa, que aconteceu no centro histórico da cidade, ocupando o Vale do Dendê no Pelourinho, com muita arte, cultura e história. O Camarote Casa de Gana (@casadegana) teve o kente como tema em sua primeira edição. O tradicional tecido da realeza africana, conhecido por suas cores, simbolismo e história. A origem do kente é artesanal e já foi reservada aos reis Ashanti, que governaram um dos maiores impérios da África, a Costa do Ouro, onde hoje se localiza Gana. O tecido se caracteriza por ser trançado a partir de tiras estreitas ou largas e apresenta padrões multicoloridos, formatos geométricos e desenhos ousados. “O Kente original é repleto de simbolismo.Cada padrão é único e tem seu próprio nome, cores e significados”, explica a Embaixadora de Gana, Abena Busia. Com a globalização e tecnologia, o kente se popularizou e hoje pode ser encontrado também em diversos modelos estampados, que imitam as cores e os desenhos da técnica ancestral. O estilista e designer Luiz do Nascimento Delaja, responsável pela curadoria da exposição do kente no camarote, é filho de mãe brasileira e pai africano e traz referências das duas culturas. Ele destaca que o uso do kente no design contemporâneo tem ganhado mais impulso. “Versões impressas do kente são produzidas, vendidas em grande escala e usadas por estilistas em vários países do mundo, mas também tem crescido a valorização pelo kente ‘verdadeiro’, feito à mão”.
Arte ancestral e artesanal
Os visitantes também puderam acompanhar de perto como é produzido um tecido kente original. O mestre tecelão e artesão ganês Richard Ohene Kumah demonstrou ao vivo como os fios coloridos são teclado em um tear tradicional, trazido especialmente para o evento. Richard diz que a arte de produzir os tecidos é uma tradição familiar e que, desde os 15 anos de idade, ele mantém vivo esse conhecimento ancestral, levando a arte do kente para países como Canadá, EUA, Catar e Brasil. “Faço isso há mais de 30 anos e consegui construir minha casa e educar todos os meus filhos com esse trabalho.”
Tradição e modernidade no universo da moda
Com a tecnologia e modernidade, o tecido real tem ganhado destaque e novas possibilidades de design no mundo da moda, incluindo a alta costura. Tanto na forma artesanal quanto nas referências em estampa. Somente no ano passado, o kente apareceu em dois tapetes vermelhos internacionais, em vestidos feitos por designers ganenses, em Acra. O tecido também tem encontrado uma nova voz entre os jovens entusiastas da arte e da moda, que se manifestaram sobre o uso de seu padrão pela Louis Vuitton, por meio do trabalho do falecido diretor artístico Virgil Abloh, filho de imigrantes ganenses. Na exposição do Camarote Casa de Gana, recebemos o “Vestido de Noiva”, uma peça criada pelo designer afro-brasileiro Luiz Do Nascimento ‘DeLaja, que mostra uma convergência entre o tradicional e o moderno. A saia é um kente branco muito raro, finamente trançado com fios de prata e ouro. Ela é drapeada sobre o corpo, seguindo a tradição africana de não cortar o tecido kente. O busto tem um toque contemporâneo com lantejoulas prateadas drapeadas à mão em uma base de espartilho, bem como um destaque de fio de metal dourado no busto. “O objetivo era lembrar o trabalho em latão e bronze pelo qual também me apaixonei e com o qual trabalhei com artesãos tradicionais em Gana”, diz ‘DeLAJA. Uma nova geração de ateliês de kente alimentou esse movimento, como a rainha-mãe HRM Nana Safoa II, criadora do Kente-Oke, com sua fusão de aso-oke e kente iorubá, Kente Kiosk, Prestige kente, Homeda e Goba. Muitos desenhos incríveis surgiram em Gana com sua reverência ao passado, mas ainda muito atuais e contemporâneos.
Em Salvador (Bahia), os irmãos Céu Rocha e Júnior Rocha criaram a marca de moda “Meninos Rei”, que vem se destacando em todo o Brasil, utilizando versões estampadas do kente, impressas em algodão. Os dois estilistas criaram um trabalho moderno que homenageia a ancestralidade, tendo como base os tecidos africanos, ao mesmo tempo em que se conecta com as criações afro-urbanas contemporâneas.